sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Da janela


Sentia-se a agitação das ervas. O vento soprava furioso, enquanto o céu cuspia largas cordas de água.

Sentou-se no beiral da janela. Gostava da desordem a que assistia. Atenta, analisava até ao mais ínfimo detalhe o mover de cada folha. No entanto, o baloiçar dos troncos das árvores mais sólidas confundiam o seu pensamento.
Todas as mudanças a apoquentavam, temia o desconhecido.
Tal qual um recém-nascido necessitava de protecção, também ela procurava acalmia. Desdenhava incertezas, já que o doce sabor da ilusão a fazia acreditar que aquela tempestade não mais voltaria.

A noite avançava veloz. Inquietas, as nuvens chocavam, emitindo um rosnar ameaçador. Ela sentia medo.
Desceu da janela e logo se refugiou no conforto do cobertor. Ah, como era bom o cobertor! Lançou um olhar sobre o céu. Não lhe parecia tão agressivo, visto dali.


Poisou a cabeça na almofada e adormeceu.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Nódoas


Perante a diversidade que, diariamente, ousa completar a sua existência, um punhado de semelhanças marca a diferença.
Transporta em si um risco de dor, uma nódoa de esperança, um motivo de vida. Aspira liberdade, anseia autonomia, deseja responsabilidade. Quer tudo e, simultaneamente, luta pelo nada. Idealiza pessoas, projecta sonhos, constrói um mundo imaginário: sem regras, longe de fazer sentido. O ambiente é meticulosamente planeado e os sentimentos seleccionados. Toda uma vida é previamente desenhada.
Mais cedo ou mais tarde, eis que surge o acaso. Traz consigo pessoas inesperadas, sonhos adormecidos, mundos inacabados. Tenta, a todo o custo, perturbar a estabilidade até aqui adquirida e rompe, sem autorização, as muralhas outrora criadas. Atónita, recebe-o receosa, no entanto, para não parecer indelicada, vai, pouco a pouco, satisfazendo suas vontades, como se de um ilustre se tratasse. Quando se apercebe, já ele dominou, já ele criou o seu próprio mundo e ela, impávida, recomeça uma vida segundo as suas leis.